Recentemente, li na Forbes Tech a excelente entrevista conduzida por Luiz Gustavo Pacete com André Weinmann, CEO da NotCo no Brasil. Foi o tipo de leitura que me faz parar e pensar como colunista que vive o agronegócio, e percebi que era hora de escrever sobre o tema sob a ótica de quem conhece o campo, mas também acompanha de perto o avanço da tecnologia.
A NotCo, foodtech chilena, vem sendo apontada como uma das empresas que estão redesenhando a indústria de alimentos no mundo. E de fato, o Giuseppe, o sistema de IA que analisa mais de 8 mil ingredientes para criar combinações de sabor e textura é uma das aplicações mais fascinantes da IA no setor alimentar.
Pacete, como sempre, foi preciso: evitou o hype e tratou a IA como ferramenta de transformação, não como espetáculo. E nisso ele acerta em cheio.
O agro continua sendo a base de tudo
Mas há um ponto que precisa ser lembrado, especialmente quando falamos de inovação alimentar.
A inteligência artificial pode criar fórmulas, prever preferências e até “cozinhar” digitalmente, mas sem o agronegócio, nada disso chega à mesa.
Quando Weinmann fala em “ampliar o acesso” e “garantir escala”, está, na prática, enfrentando os mesmos desafios que o agro domina há décadas: logística, eficiência produtiva e distribuição nacional.
O Giuseppe pode sugerir o ingrediente ideal, mas é o produtor rural quem planta, colhe, transporta e garante a qualidade da matéria-prima.
É o agro e não o algoritmo, que sustenta o ecossistema da alimentação.
Tecnologia e campo não são opostos
O grande mérito da entrevista de Pacete está em mostrar que IA e agro não estão em lados opostos, mas no mesmo tabuleiro. Enquanto startups como a NotCo aplicam dados para entender sabores, o agronegócio brasileiro já usa inteligência artificial há anos: na previsão de safra, na aplicação precisa de insumos, no controle de pragas e no monitoramento climático.
A diferença é que o agro opera em escala continental, alimentando mais de um bilhão de pessoas com eficiência crescente e com cada vez mais tecnologia embarcada.
Por isso, quando vejo o entusiasmo em torno da NotCo, vejo também uma oportunidade: trazer o agro para o centro da conversa sobre IA e alimentação.
Sustentabilidade com raízes
Weinmann fala de sustentabilidade, e com razão, mas é importante lembrar que o Brasil já é referência mundial nesse tema.
As práticas de agricultura regenerativa, o uso de biotecnologia e as metas de carbono neutro mostram que o agro nacional está muito à frente do que se imagina quando o assunto é produzir de forma sustentável.
Enquanto foodtechs simulam sabores, o agro real está regenerando solos, preservando biomas e garantindo segurança alimentar global. E, é exatamente essa combinação de tradição e tecnologia que deve guiar o futuro da alimentação.
O futuro será híbrido: solo e software
O que Pacete e Weinmann revelam é algo que vai muito além da NotCo: estamos entrando na era da alimentação híbrida, em que dados e biologia, algoritmos e sementes, convivem de forma sinérgica.
A IA vai acelerar descobertas. O agro vai garantir produção, logística e escala.
E quando esses dois mundos se unem, nasce o verdadeiro poder de inovação para aquele que alimenta de forma inteligente, sustentável e acessível.
Porque, no fim das contas, o algoritmo pode até aprender a cozinhar.
Mas é o agro que planta, colhe e continua alimentando o mundo.