COMPARTILHE

Quero contar como, no auge dos meus doze anos, na minha adolescência cheia de soberba e “sabedoria”, aprendi uma dura lição que me ajudou a chegar até aqui!
Esta parte da minha vida se passa em uma realidade simples, mas repleta de amor e dedicação e foi essa a base que a minha mãe construiu com sangue, suor e lágrimas para criar a mim e à minha irmã mais nova.

Em uma noite tranquila de 1988, me lembro de termos voltado do Jumbo Eletro com as compras do mês. Isso mesmo, naquela época fazíamos compras para o mês todo. Isso não significava um volume muito grande, até porque não tínhamos geladeira (isso é assunto para outro artigo). Em casa, havia apenas um freezer azul horizontal e, como sabemos, tudo que ia para o freezer congelava ou seja, não era tão simples assim.

Naquela época de vacas magras, em nossa casa a comida básica do dia a dia era normalmente ovos e arroz branco, às vezes miúdos de galinha, bife de fígado e, aos finais de semana, um maravilhoso frango assado. Vale o registro, tirando os miúdos, o resto ainda sou apaixonado até hoje!

Chegando em casa, já um pouco tarde da noite, eu e minha irmã tínhamos o trabalho de organizar as compras, enquanto minha mãe corria para fazer o prato padrão da semana, arroz branco com ovo. Simplesmente sensacional! Arrumamos a mesa, eu fiquei encarregado de fazer o suco Tang que devia ser sabor “qualquer coisa”, eu acho, e então sentamos esperando a minha mãe servir os pratos.

Escrevendo este artigo consigo lembrar, com exatidão, a cena até nos pequenos detalhes, como o “braço” do fogão onde minha mãe colocava a caixa de ovos de um lado e os temperos do outro. Sensacional! Lembro do momento em que recebi meu prato, quase chorei de alegria. Sabe aquele arroz branco soltinho, saindo fumaça, com um ovo de cinema no topo da montanha? Peguei o garfo e explodi o ovo, causando uma erupção extraordinariamente linda, com a sua calda de coloração dourada brilhante. É neste momento que você começa a misturar o arroz com o ovo e uma das comidas mais perfeitas do meu mundo se formava diante de mim.

Acredito que levei uns longos 30 segundos para devorar o primeiro prato, acho que não deu tempo nem de a minha mãe se sentar à mesa. Foi quando pedi o segundo prato, e ela me serviu. Da mesma forma, finalizei aquele prato “três estrelas Michelin” em poucos minutos.

Você já passou por algum momento da vida em que, antes mesmo de terminar uma frase, já vem aquela sensação de arrependimento… e aí já é tarde? Pois bem, nesse momento da minha vida, tive a espetacular ideia de pedir à minha mãe, ainda em pé, que fizesse o terceiro ovo para mim, claro com arroz.

Me lembro da minha mãe, espantada comigo, dizendo ainda com carinho e amor no coração:

— Meu filho, já é tarde. Você já comeu dois ovos, isso já está bom. Não vou fazer o terceiro ovo para você porque você vai passar mal.

Neste momento, exatamente neste momento, que ecoa até hoje na minha mente eu, um menino muito “inteligente, sábio e especial”, respondi:

— Mãe, eu não acredito que você vai negar comida para o seu filho! (Aqui jaz).

Quando tentei segurar a última palavra que saiu pela minha boca, junto com o arroz e o ovo anterior, já era tarde. Consigo me lembrar da minha mãe se transformando no “Esqueleto”, personagem do He-Man (alguns entenderão), olhando para mim.

O tom suave do início do jantar já não pertencia mais àquele corpo. A voz, agora, era tipo Darth Vader falando com seu filho:

— Não seja por isso, meu “amor”. A mamãe jamais irá negar comida para você.

E, naquele instante, abrindo uma caixa inteira de ovos, o meu destino foi selado pelos 30 minutos seguintes, minha vida se transformou em um filme “À Espera de um Milagre” que é claro não veio. Tive que comer, um a um, os doze ovos feitos pelo próprio “Esqueleto” (minha mãe).

Não preciso dizer que, após esse magnífico jantar em família, a minha noite foi literalmente de um rei… em seu trono noturno. Me lembro que só voltei a comer ovo depois de casado. Não sei por quê!

Mas, acredite se quiser, essa trágica e divertida parte da minha vida me ensinou muito. Me ensinou a pensar antes de falar, a respeitar os mais velhos, a entender a preocupação da minha mãe comigo, entre tantas outras coisas.

No fundo, o grande segredo daquela noite não estava nos 12 ovos, nem na bronca, nem no desconforto que veio depois. O segredo estava no que ficou, a compreensão de que educação, de verdade, não vem só das palavras ditas, mas dos limites que nos são impostos, dos “nãos” que ouvimos e das lições que, muitas vezes, doem no momento, mas moldam quem somos para o resto da vida.

Aprendi que respeito e gratidão não se pedem, se cultivam. Que a mesa simples de arroz e ovo tinha mais riqueza do que eu poderia imaginar, porque estava temperada com amor, cuidado e sacrifício. E que, por trás de cada “não” que minha mãe dizia, havia um “sim” muito maior para o meu futuro.

Hoje, ao olhar para trás, entendo que aquele jantar foi muito mais do que uma história engraçada para contar. Foi uma aula de caráter, de empatia e de presença. E é isso que carrego comigo até hoje, a certeza de que a verdadeira educação é servida em doses generosas de amor, acompanhada de disciplina e de exemplos que marcam para sempre.

Dijan de Barros

Os artigos publicados são de responsabilidade dos colunistas e não refletem, necessariamente, a opinião do Portal Total News

Foto de Dijan de Barros

Dijan de Barros

Empreendedor, especialista em gestão e marketing, apresentador, palestrante, TEDxOrganizer, fundador do Café com Negócios e Diretor da Totvs Oeste | @dijanbarros
Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors

Total News MS

AD BLOCKER DETECTED

Indicamos desabilitar qualquer tipo de AdBlocker

Please disable it to continue reading Total News MS.